Grupo de Economia da Energia

Evolução recente e tendências para a formação de preços no mercado mundial de GNL

In GNL on 29/11/2010 at 00:15

Por Edmar de Almeida

O Comércio mundial de Gás Natural Liquefeito (GNL) experimentou uma enorme expansão nas últimas duas décadas. Esta expansão foi acompanhada por uma evolução importante das formas de precificação e dos tipos de contratos utilizados no comércio de GNL. Tradicionalmente, o comércio de GNL esteve ancorado em contratos de longo-prazo com uma precificação que tentava associar o preço do GNL aos dos combustíveis concorrentes (petróleo ou derivados). Esta forma de comercialização predomina até hoje nos mercados de GNL da Ásia e parte da Europa.

A liberalização dos mercados de gás na América do Norte e em alguns países europeus permitiu o surgimento de novas regras de precificação do gás natural. Com o aumento gradativo da competição gás-gás, alguns mercados de curto-prazo e spots se desenvolveram, viabilizando a utilização de novos indexadores para o comércio do gás natural. Concomitantemente ao surgimento de mercados spot de gás na América do Norte e na Europa, assistimos um rápido desenvolvimento do mercado de GNL na Bacia do Atlântico. A capacidade de regaseificação da Bacia do Atlântico atualmente se aproxima da metade da capacidade mundial. Países como os Estados Unidos e Reino Unido, que havia deixado de importar GNL na década de 1980, voltaram a importar GNL nos anos 2000.

Gráfico 1 – Capacidade Global de Regaseficação 2005-2010

Fonte: Plats

A entrada de países com mercados de gás liberalizados no comércio mundial de GNL induziu a utilização de novas formas de precificação do GNL. Os contratos de importação de GNL por estes países passaram a utilizar como indexadores o preço do gás no mercado spot. Os contratos de importação de GNL para os Estados Unidos utilizaram o preço do gás no mercado spot do Henry Hub e os contratos para o Reino Unido o preço spot do NBP (National Balancing Point). Os contratos de importação de GNL indexados ao Henry Hub e NBP puderam ser desdobrados em contratos de curto-prazo ou de opção no mercado secundário. Ou seja, o fornecedor de GNL para um consumidor nos EUA ou Reino Unido sempre tem a opção de não entregar o GNL e comprar o volume correspondente no mercado spot destes países para entregar ao seu cliente. Desta forma, caso haja interesse de terceiros compradores, é possível revender o GNL contratado nestes mercados, a preços superiores aos dos seus respectivos mercados spot.

Com a possibilidade da flexibilização dos contratos, o comércio de GNL na Bacia do Atlântico se dinamizou significativamente. Países como o Brasil, que buscam uma oferta de gás flexível puderam encontrar no GNL uma solução interessante. A participação dos contratos flexíveis atingiu cerca de 22% do comércio de GNL em 2009 e espera-se que chegue a 30% em 2010 (estimativa da BP Statistics).

Gráfico 2 – Participação dos Contratos Flexíveis no Comércio Mundial de GNL

Fonte: BP Statistical Review

Vale ressaltar que o comércio de GNL na região das Américas passou a utilizar o preço do Henry Hub como indexador nos seus contratos. Grandes players da indústria de GNL investiram bilhões de dólares em capacidade de liquefação e navios sem ancorar estes investimentos em contratos de longo-prazo. O mercado de gás dos Estados Unidos passou a ser visto como um mercado back-up para os contratos flexíveis e para a capacidade de liquefação descontratada e ofertada no mercado mundial de GNL de curto-prazo. A premissa básica para esta estratégia de comercialização de GNL é que as importações americanas de GNL tenderiam aumentar a médio e longo-prazos, garantindo um mercado de back-up.

Nos últimos três anos, começaram aparecer sérias dúvidas quanto à validade desta premissa. A produção de gás nos EUA começou a crescer de forma rápida contradizendo uma expectativa de redução desta produção. Esta evolução da produção de gás nos EUA esteve associada às importantes inovações tecnológicas que reduziram significativamente o custo de produção do gás não-convencional. Em função deste crescimento não-esperado da produção, o Departamento de Energia dos Estados Unidos foi obrigado a fazer sucessivas revisões de quanto às suas previsões de importação de GNL pelo país.

Gráfico 3 – Previsão de Importações de GNL pelos Estados Unidos

Fonte: EIA-DOE

Concomitantemente à redução das previsões de importação de gás pelo Departamento de Energia dos EUA, o mercado passou a emitir um sinal de alerta importante para os produtores de GNL. O preço do gás no Henry Hub acompanhou a queda dos preços do petróleo em 2008 e continuou estável num patamar muito baixo, após a recuperação dos preços do petróleo durante o ano de 2009.

Gráfico 4 – Evolução dos preços do Petróleo e do Gás Natural no Henry Hub (EUA)

Fonte: MME

A dinâmica do mercado mundial de gás nos últimos 2 anos colocou em questão a estratégia de precificação do gás na Bacia do Atlântico. Os produtores de GNL passaram a estar expostos a um risco de mercado desconhecido até recentemente. A incerteza quanto à possível evolução dos preços do gás no mercado americano levam os produtores a se perguntarem se não seria hora de voltar a utilizar uma estratégia de precificação de gás mais convencional, em particular nos países onde não existe mercado spot de gás.

Atualmente o mercado mundial de GNL encontra-se numa situação de excesso de oferta de capacidade de liquefação, em função da crise de econômica mundial. Neste contexto, os produtores tendem a aceitar contratos ainda vinculados ao Henry Hub. Entretanto, muitas dúvidas pairam sobre qual será a evolução das formas de precificação de gás nos novos projetos de liquefação. O preço do gás nos Estados Unidos continuará sendo um marcador para o comércio de gás nas Américas? A tendência de redução dos prazos e aumento da flexibilidade dos contratos deverá persistir?

O estabelecimento de uma estratégia de comercialização de GNL na nossa região depender muito das respostas a estas questões.

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