Grupo de Economia da Energia

Novas diretrizes para o setor elétrico: o debate europeu e a situação brasileira

In energia elétrica on 11/07/2011 at 00:10

Por Luciano Losekann

Nos dias 19 a 23 de junho, foi realizada a 34ª Conferência Internacional da IAEE (Associação Internacional de Economia da Energia) em Estocolmo. Esse é o principal encontro mundial na área de Economia da Energia, com a fronteira dos debates acadêmicos presente em suas sessões.

Nessa edição, o tema principal, que foi tratado nas plenárias de abertura e de encerramento da conferência, foi o desafio de promover a redução de emissões de CO2 na geração de eletricidade na Europa. É importante notar a plena incorporação da agenda ambiental na política energética para o setor elétrico na Europa. As principais referências acadêmicas de análise do setor elétrico da Europa têm orientado pesquisa para esse tema.

A diretiva da União Européia para fontes renováveis tem a meta ousada de atingir 20% de participação na matriz energética em 2020 (o que é parte do pacote 20 20 20[1]). O método escolhido para atingir esse objetivo foi o cap and trade, através do sistema ETS (Sistema de Comercialização de Emissões). O método fixa permissões de emissões negociáveis para os Estados Membros e o preço do carbono se ajusta às condições de mercado.

A apresentação de David Newbery, que abriu a conferência de Estocolmo, apontou as fragilidades do ETS para incrementar a participação de fontes renováveis na matriz de geração de eletricidade. Apesar de negociar volumes crescentes de direitos de emissão (EUA) desde 2005, quando o ETS foi criado, o preço do direito de emissão tem sido volátil e baixo (figura 1). A excessiva oferta de certificados durante a primeira fase de implementação do ETS e a crise econômica pós 2008 não permitiram que o preço sustentasse o patamar de € 30/ton. que é o limite necessário para tornar as fontes renováveis competitivas.

Em função da volatilidade de preços inerente a sistemas cap and trade, potenciais investidores em fontes renováveis, que estão sujeitos a riscos superiores aos das fontes tradicionais, não dispõem de sinais estáveis e previsíveis para realizarem investimentos. O efeito é mais evidente para os gastos com Pesquisa e Desenvolvimento, que experimentam tendência declinante desde a liberalização do setor elétrico. Segundo Newbery, subsídios ao P&D em fontes renováveis se justificariam pelos ganhos de aprendizagem que tendem a tornar essas fontes competitivas no futuro.

Figura 1 – Evolução do volume negociado e do preço de direitos de emissão de CO2 na Europa

Fonte: House of Commons – UK, Standard Note SN5927 Carbon Price Support, 2011.

Segundo o autor, a iniciativa do Reino Unido de instituir um piso crescente para o preço do carbono (CPS – Carbon Price Support)  através de taxação a partir de 2013 pode significar um caminho para a União Européia. O governo do Reino Unido decidiu liderar o processo de mitigação de emissões na Europa. É um entendimento que, para reduzir a emissão em 20%, é necessário que as fontes renováveis representem 40% da energia elétrica gerada. Hoje, esse posicionamento é motivo de debate no Reino Unido em função de seus efeitos sobre a competitividade dos produtos britânicos.

Um desafio para as autoridades européias e, particularmente, do Reino Unido é atender ao objetivo de reduzir emissões em um contexto em que os instrumentos de coordenação setorial são limitados. No setor elétrico do Reino Unido, que foi um paradigma para as reformas dos anos 1990 e que aprofundou a liberalização no início dos 2000, o mercado de eletricidade funciona de forma descentralizada com pouca coordenação. A incompatibilidade do desenho de mercado com os ambiciosos objetivos de política energética motivou a iniciativa em andamento de rever o modelo institucional do setor no Reino Unido.

Esse foi o tema da apresentação de Richard Green na mesa que encerrou a conferência. O autor apresentou uma série de questionamentos sobre um novo desenho institucional para o setor elétrico do Reino Unido. São alternativas possíveis, a retomada de um mercado de eletricidade centralizado e compulsório como era o Pool e de um encargo de capacidade, elementos que foram eliminados com a instituição do NETA (New Electricity Trade Arrangements) no Reino Unido. Entre os mecanismos discutidos para ampliar a participação de fontes renováveis na matriz de geração, constava a licitação competitiva para a expansão de capacidade.

É interessante verificar como o Brasil se enquadra nessa discussão. Apesar de a temática ambiental ter ganhado relevância nos últimos anos, esse ainda não é o tema dominante da política para o setor elétrico brasileiro.  Mesmo que atrasado na discussão de política de redução de emissões, os mecanismos que faltam aos países de Europa para promover a difusão de fontes renováveis estão presentes no setor elétrico brasileiro. Por outros motivos (segurança do abastecimento e modicidade tarifária), o modelo brasileiro dispõe de um forte instrumento de execução de políticas para orientar a expansão da capacidade de geração. Os leilões de energia do mercado regulado permitem a promoção de fontes renováveis, com a contestação de mercado, o que evita a alocação indevida de recursos.

Ou seja, no setor elétrico do Reino Unido, as metas de mitigação de emissão são ambiciosas, mas os instrumentos, débeis. Já no Brasil, os objetivos ainda não estão delineados, mas os instrumentos são poderosos.


[1] 20% de redução de emissões de gases de efeito estufa, 20% de participação de renováveis na matriz energética e 20% de ganho de eficiência no uso de energia em 2020.

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